
Governo obtém aval a medidas de receita, mas ceticismo sobre meta permanece
Haddad sinaliza mais iniciativas e defende agenda de recomposição da base fiscal do Estado
Apesar de ter conquistado o aval do Congresso à maior parte de seu pacote fiscal, o ministro Fernando Haddad (Fazenda) encerra o ano sem eliminar o ceticismo dos economistas sobre a meta de zerar o déficit do governo em 2024.
As alterações feitas pelos parlamentares nas propostas reforçam o questionamento sobre o potencial arrecadatório das medidas e a incerteza sobre a trajetória das contas públicas nos próximos anos.
Mesmo sem acesso a projeções atualizadas do Ministério da Fazenda sobre o ganho potencial com as medidas aprovadas, especialistas em contas públicas afirmam que os números divulgados originalmente não serão alcançados.
O cenário fica ainda mais prejudicado pela esperada desaceleração da economia no ano que vem, que deve limitar a expansão natural das receitas.
Haddad, por outro lado, diz que novas medidas poderão ser lançadas. A interlocutores, ouvidos pela Folha, o ministro tem reiterado que continua em sua agenda de recomposição da base fiscal do
Estado brasileiro -que, em sua visão, foi dilapidada nos últimos anos.
A estratégia está alinhada com a ministra Simone Tebet (Planejamento), que tem mencionado “cartas na manga” a serem usadas em caso de necessidade.
A IFI (Instituição Fiscal Independente, órgão do Senado que monitora as contas públicas) calcula em seu cenário-base que o conjunto de medidas legislativas lançadas pelo governo neste ano para equacionar o Orçamento de 2024 deve render R$ 48,6 bilhões no ano que vem. O número representa menos de um terço dos R$ 168,5 bilhões projetados pelo governo inicialmente.
A diferença para a projeção oficial é explicada pela posição mais conservadora da IFI, que leva em conta tanto as modificações feitas pelo Congresso como possíveis questionamentos no Judiciário sobre algumas das medidas -como a recuperação de créditos no Carf (Conselho Administrativo de Recursos Fiscais). Só com essa medida, o governo disse esperar R$ 97,9 bilhões (enquanto a IFI calcula R$ 30,3 bilhões).
Em setembro, enquanto muitas das medidas do pacote estavam ainda em discussão, os analistas consultados pelo Banco Central diziam confiar em metade das receitas necessárias para zerar o déficit em 2024, incorporando R$ 80 bilhões extras.
Vilma da Conceiçao Pinto, diretora da IFI, vê a possibilidade de o governo seguir três caminhos diante desses números.
O primeiro é a mudança da meta, que ela considera ruim por configurar uma fuga das regras do arcabouço logo no primeiro ano de vigência.
O segundo cenário é o de descumprimento da meta, o que acionaria gatilhos para limitar despesas a partir de 2025. Esse caminho vem sendo defendido pelo presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL).
O texto do arcabouço veda um conjunto de iniciativas (como reajustes para servidores públicos e medidas que gerem crescimento real de gastos obrigatórios) caso o resultado do ano fique abaixo do limite inferior do objetivo traçado. Para 2024, é permitido um déficit de até 0,25% do PIB (ou R$ 28,7 bilhões, considerando os dados projetados no envio das diretrizes orçamentárias).
A terceira alternativa considerada pela economista é pensar em outras medidas de ajuste fiscal, como tem reforçado Haddad nos últimos dias. Para ela, no entanto, será preciso expandir a discussão ao planejar as próximas iniciativas.
“A melhor direção seria essa última [novas medidas]. Mas é importante notar que não dá para deixar todas as fichas nas receitas. Será preciso avançar na agenda de eficiência e qualidade dos gastos primários”, afirma ela.
Felipe Salto, economista-chefe da Warren Investimentos, também trabalha com números mais conservadores para a arrecadação. “Entendemos que, no conjunto, será possível arrecadar algo como um terço do total previsto [pelo governo] em receitas novas”, afirma.
Ele projeta um déficit primário no ano que vem de 0,73% do PIB, mas diz que o número poderá se aprofundar caso prospere o movimento do governo para limitar o contingenciamento em 2024 a pouco mais de R$ 20 bilhões -o que, para ele, contraria a lei complementar do arcabouço.
Atualmente, o mercado estima déficit primário de 0,76% do PIB em 2024. O dado consta no boletim Focus, pesquisa semanal do BC com analistas do mercado, divulgado na última segunda-feira (11).
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