Governo quer criar programa de revisão de gastos e evita palavra ‘corte’ para reduzir desgaste
Ainda não há decisão se o texto do PLDO vai incluir todos os detalhes do programa ou apenas um comando geral para sua previsão na LOA
O governo estuda a criação de um programa formal para a revisão de gastos públicos. A proposta, elaborada pela equipe da ministra Simone Tebet (Planejamento e Orçamento), já está pronta e deve ser apresentada na próxima semana ao ministro Fernando Haddad (Fazenda).
A ideia é incluir o programa já no PLDO (Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias) de 2025, que será enviado em 15 de abril ao Congresso Nacional, para que as medidas de revisão sejam incorporadas na elaboração da proposta orçamentária e possam entrar em vigor no ano que vem.
Ainda não há decisão se o texto do PLDO vai incluir todos os detalhes do programa ou apenas um comando geral para sua previsão na LOA (Lei Orçamentária Anual). Integrantes do governo a par das discussões afirmaram à Folha que há divergências em torno de qual dos dois caminhos seguir.
O diagnóstico da área econômica é que a situação fiscal não será fácil em 2025, dado um aumento já contratado em despesas obrigatórias, e que o governo precisará tirar o programa do papel para conseguir fechar o Orçamento.
O ponto central da discussão é que a economia obtida com as ações teria de ser suficiente para acomodar todas as despesas programadas pelo governo.
Para os técnicos, há prós e contras em incluir o programa inteiro já no PLDO. Por um lado, há a avaliação de que retirar depois alguma política incluída no programa terá um custo elevado para o governo —o que acaba dando força ao processo de revisão.
Por outro lado, há quem afirme que o governo compraria uma briga grande de imediato em abril e que seria melhor esperar para enfrentar o tema de maneira mais firme no final de agosto, no envio do projeto do Orçamento. A revisão de gastos começaria, na prática, em 2025.
O tema é politicamente sensível para o governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT) porque é associado a cortes de políticas públicas, ainda que sejam despesas consideradas ineficientes dos ministérios.
Aliados políticos alertaram o presidente para o risco de adotar medidas impopulares que possam levar a cortes de gastos com efeito recessivo sobre a atividade econômica.
O fato de ser ano de eleições municipais, no qual o PT busca ampliar o número de prefeitos e vereadores, também não ajuda. Os técnicos já eliminaram a palavra “corte” do vocabulário nas discussões para não aumentar as resistências. A ordem é usar sempre a palavra “revisão”.
O projeto vai reforçar o papel do CMAP (Conselho de Monitoramento e Avaliação de Políticas Públicas). A ideia é que as reuniões do órgão sejam mais transparentes, com a pauta das reuniões que debatem a revisão divulgadas publicamente.
O conselho já funciona fazendo avaliações das políticas públicas, mas não conseguiu tirar nada do papel no primeiro ano do governo Lula. A criação de um programa formal daria mais força para a implementação da medida, na avaliação dos defensores da iniciativa.
A demora em avançar nessa pauta tem causado desconforto na equipe de Tebet, que assumiu o cargo tendo essa pauta como uma bandeira. Ela chamou um dos maiores especialistas em avaliação de gastos do país, o economista Sergio Firpo, para comandar a secretaria responsável por implementar a revisão.
Até agora, o governo tem apenas uma tentativa declarada de revisão de gastos, focada nos benefícios do INSS (Instituto Nacional do Seguro Social).
O Executivo incluiu uma economia de R$ 12,5 bilhões no Orçamento, valor colocado como uma espécie de meta —se não for atingida, será preciso cortar de outros lugares para repor o pagamento dos benefícios.
Um grupo de trabalho foi criado para colocar em marcha o processo de revisão dos benefícios, mas os números estimados são vistos com ceticismo por economistas de fora, para quem o governo subestima despesas ao incorporar esses valores ao Orçamento.
Outras áreas já estão no radar dos formuladores do programa.
Como mostrou a Folha, o governo discute a possibilidade de fixar um limite para as deduções de gastos médicos no IRPF (Imposto de Renda da Pessoa Física), um tipo de gasto tributário que acaba beneficiando mais os contribuintes de maior renda.
Ações dos ministérios da Saúde e da Educação e a própria revisão do Cadastro Único (CadÚnico) de benefícios sociais também estão na mira do grupo que trabalha na elaboração do programa.
O MDS (Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome) já tirou 1,7 milhão de famílias unipessoais da lista de beneficiários do Bolsa Família, mas o processo de averiguação e revisão dos cadastros continua em 2024.
Integrantes do Planejamento também têm feito contato com representantes dos estados na tentativa de difundir a metodologia de revisão de gastos em construção pelo governo e fortalecer a agenda politicamente.
No âmbito da União, há um esforço do Planejamento para obter da JEO (Junta de Execução Orçamentária) a validação da lista de políticas a serem alvo da revisão.
O colegiado é formado por quatro ministros —além de Haddad e Tebet, também integram a junta Rui Costa (Casa Civil) e Esther Dweck (Gestão)—, e seu respaldo daria mais peso à agenda, cujo avanço dependerá também do Congresso.